Irrigação em pastagens: momentos e viabilidades de utilização
Noto que para muitos, a irrigação é considerada como a solução para todos os problemas da produção animal e ainda, para a produção de alimentos. A irrigação, como o nome diz, é simplesmente molhar certa área em substituição ou acréscimo a água provinda de chuva. Se faltar chuva, o que precisamos é irrigar. Fácil seria de pensássemos que simplesmente fosse apenas molhar o solo e estaria tudo certo. Como em qualquer situação, tudo deve ser analisado.
A irrigação de pastagem molha a planta e o solo. Perfeito até aqui. Mas para este fato, precisamos entender que estamos molhando, além do solo, a planta, que irá absorver esta água.
Quando falamos de forrageira, devemos saber que existem dois tipos de famílias: gramíneas e leguminosas ou ainda, Poacea e Fabacea. Vamos focar um pouco mais nas gramíneas, foco de nosso assunto de hoje, correlacionando elas com a irrigação.
Temos gramíneas de clima temperado (como por exemplo a aveia ou azevém) e de clima tropical (capins em geral, incluindo Braquiária, Tanzânia, Mombaça etc). Primeiramente devemos saber de forma geral que estas são bem diferentes em relação aos requisitos para crescimento. Para comentarmos de forma geral, a aveia por exemplo, cresce em climas frios (em temperaturas abaixo de 15ºC), enquanto que a Braquiária cresce em temperaturas acima de 15ºC. Ao considerarmos temperaturas ideais, podemos dizer que para a aveia, ela é aproximadamente de 5ºC e para a braquiária de 30ºC.
Muitos produtores me perguntam o quanto de água é necessário para irrigar um hectare de Braquiária. Não quero deixar aqui nenhuma fórmula, mas já adianto que as forrageiras de ciclo C4 precisam por volta de 4 mm de chuva por dia, ou ainda 4 litros de água por m2 por dia. Logicamente que na irrigação não iremos colocar todo dia 4 litros de água por m2 e sim colocarmos a água proporcionalmente para x m2 e x dias, ou ainda colocaremos água para 5 ou 6 dias, molhando então 20 litros por m2 – a cada 5 dias por exemplo. Se considerarmos esta conta, vamos pensar que precisaremos por volta de 25 mil litros de água por dia/hectare. Lembro-me muito bem que fui chamado por um produtor e este me disse que queria irrigar sua pastagem e já tinha água. Disse-me que teria até 3 mil litros de água por dia, o que com certeza, foi impossível de viabilizar, pois para irrigar pasto, é necessária muita água. Isto é um fato que deve ser considerado.
Outro fator interessante que me veio a mente é o fato da estacionalidade de produção de forragem que ocorre normalmente, quando, principalmente, temos a falta de requisitos para o crescimento da forrageira. Como disse anteriormente, temos diferenças, mas toda forrageira precisa de nutrientes para crescer. Este requisito nunca faltará desde que adubemos nosso solo. Pronto, problema número um resolvido. Em segundo, terceiro e quarto ponto, teremos a luz, temperatura e umidade. Umidade se dá pela chuva ou irrigação. E a temperatura e luminosidade? Temperatura é o fator – segundo a literatura – que mais influência na estacionalidade de produção forrageira. Com certeza, para forrageiras de clima tropical como a Braquiária e com temperaturas abaixo de 15ºC, não teremos crescimento considerável. Neste caso, ainda pensando na temperatura, teremos uma atitude diferente com relação às forrageiras de clima temperado – como a aveia, que cresce em temperaturas mais baixas. Bom, e na prática?
Irrigar uma forrageira como a Braquiária em dias frios é perder tempo e dinheiro, pois não teremos crescimento, já que ainda falta luz e temperatura para ela crescer. Incrivelmente, a irrigação de pastagem somente funcionará quando temos os outros fatores favoráveis: temperatura e luminosidade ideais. No inverno, como mencionado, não temos condições favoráveis e assim ela não crescerá.
Trabalhos conduzidos na Embrapa Pecuária Sudeste em 2006 mostram que nos momentos que antecedem o período frio (março/abril) e após o período frio (agosto/setembro), ou ainda, naquele momento que não temos nem inverno e nem verão, a irrigação funciona, pois neste momento temos luz, temperatura e o fator limitante, que neste caso, é a água. Trabalhos conduzidos mostraram a eficiência da irrigação nestes momentos e, no verão, em momentos que chamamos de veranicos, ou seja, que não chove.
Para forrageiras de clima temperado, como aveia, que gosta de pouca luz e de temperaturas mais amenas, a irrigação no inverno seria viável, pois é a única condição que interfere negativamente no crescimento dela – desde que ela esteja adubada. Voltando aos exemplos bobos do carro citados no início deste artigo, será que conseguiremos colocar apenas um litro de gasolina para andar a semana toda, ou ainda será que iremos colocar água à vontade ou em menores quantidades na forrageira?
O processo requer eficiência e acompanhamento técnico; será que podemos colocar um teto solar neste carro, em uma região que faz muito frio, ou ainda irrigarmos a forrageira de clima tropical no inverno? Ela crescerá? Será que podemos colocar um turbo neste carro, sem ao menos percebermos que lhe falta os pneus, ou até mesmo o motor, ou ainda, nós atendemos todos os requisitos para a forrageira crescer antes de irrigar? Ela está bem adubada e bem manejada? Poderíamos sair correndo nas pistas em qualquer velocidade? Vamos irrigar quando quisermos? Teremos penalidades, gastos de tempo e dinheiro.
Apenas uma rápida reflexão sobre um assunto fácil, porém delicado. Água não sobra em todo canto e também, não precisamos necessariamente irrigar para produzir forrageira. O que precisamos é planejar nossa produção agropecuária, nossas estratégias e contornar nossos problemas. Para toda decisão há um momento e para todo momento há um acontecimento.
Texto: Marco Aurélio Factori
Fonte: MilkPoint