Gotejamento Enterrado em Café

Cafeicultura Irrigada

O Brasil já irriga 260.000 hectares de todo o seu parque cafeeiro, o que representa pouco mais de 10% da cafeicultura nacional. O que chama a atenção é que esta fatia responde por 25% da produção nacional, mostrando a grande competitividade da cafeicultura irrigada nacional.

Os cafezais irrigados estão mais concentrados nos estados do Espírito Santo, Minas Gerais, Bahia e, em menor proporção em Goiás, Mato Grosso, Rondônia e São Paulo.

A irrigação tem sido utilizada mesmo nas regiões consideradas tradicionais para o cafeeiro, como o sul de Minas Gerais, Zona da Mata de Minas Gerais, Mogiana Paulista, Espírito Santo, etc.

Em geral, a irrigação do cafeeiro é feita por dois métodos: aspersão e irrigação localizada. Os sistemas de aspersão utilizados na irrigação desta cultura são os seguintes: aspersão convencional móvel (com aspersores pequenos, médios e canhões) ou fixa (que inclui o sistema de aspersão em malha), auto propelido de pivô central. Em função de aspectos relacionados ao consumo de energia, exigência de mão de obra e outros aspectos operacionais, os sistemas mais viáveis de irrigação por aspersão têm sido o convencional (principalmente do tipo malha) e o pivô central. Já com relação à irrigação localizada, os sistemas mais utilizados são o gotejamento, por suas características técnicas que permitem uma irrigação com grande precisão, economia de água e energia e as fitas de polietileno (sistema também conhecido como “tripa”), principalmente pelo menor custo de implantação.

Irrigação Localizada

Compreende os métodos de irrigação em que a água é aplicada diretamente sobre a região radicular, em pequena intensidade e alta frequência, para manter a umidade próxima da ideal, que é a chamada capacidade de campo. O principal sistema é o gotejamento, onde a água é aplicada de forma dirigida e localizada na zona de maior aproveitamento das raízes das plantas. São caracterizados pela localização, que implica num umedecimento parcial da área total sob irrigação, reduzindo, portanto, o volume total de solo explorado pelas raízes. O restante da área não se umedece, fazendo com que a planta modifique seu crescimento radicular, o qual se concentra no volume de solo umedecido. Outro aspecto importante a ser salientado é a alta frequência de aplicação de água, procedimento praticamente imposto pelo baixo volume de solo explorado pelas raízes, a fim de compensar o consumo normal de água pelas plantas.

No que se refere especificamente ao gotejamento, quando a água é aplicada de forma pontual, toda a propagação de umidade ocorre através do ponto de emissão, que difunde a água mediante um fluxo tridimensional, formando os chamados bulbos de umedecimento, cujas formas e dimensões dependem das propriedades físicas do solo e das características da aplicação: textura, vazão e tempo de irrigação.

Nas chamadas linhas de aplicação contínua, produzidas pela instalação muito próxima de gotejadores, tendência nos projetos de café, ao invés de realizar-se em um ponto, a aplicação tem a forma de uma linha contínua. Nesse caso, o regime de fluxo se realiza em duas dimensões.

Vantagens e limitações do gotejamento

Muitos produtores de café nos últimos anos têm procurado empresas de irrigação de gotejamento para a irrigação de suas lavouras, devido às suas vantagens com relação aos demais sistemas, por exemplo:

  • Economia na aplicação de água: é um dos sistemas que utilizam menos água. Levando-se em conta a escassez de água que muitas regiões cafeeiras enfrentam, é uma opção tecnicamente viável.
  • Alta uniformidade na aplicação de água: comparado com outros sistemas, se o projeto é adequado, o gotejamento pode atingir coeficientes de uniformidade acima de 90%.
  • Possibilidade de aplicação de vários produtos via água de irrigação: graças à sua alta uniformidade, o sistema permite a aplicação de fertilizantes (macro e micro nutrientes), hormônios vegetais, corretivos de solo, inseticidas, adubos orgânicos, dentro outros produtos.
  • Menos concorrência com plantas invasoras: como os gotejadores irrigam apenas parte da área (25% a 30%), formando uma faixa molhada, as entrelinhas não são irrigadas, inibindo o crescimento do mato nas épocas de estiagem.
  • Permite aplicar os nutrientes em cada fase fenológica do cafeeiro: pela facilidade de fertirrigação, permite-se a aplicação de fertilizantes em quantidades e frequências que maximizam a produção do cafeeiro e evitam perdas dos nutrientes.

Apesar das vantagens, o sistema apresenta alguns inconvenientes, como a obstrução dos emissores (devido aos reduzidos diâmetros dos gotejadores e à falta de manutenção dos sistemas), alto custo inicial e falta de mão de obra especializada.

Gotejamento enterrado ou em superfície?

Os sistemas de irrigação por gotejamento superficial constituem o método de aplicação mais utilizado entre os sistemas por gotejamento para café. As vantagens do gotejamento superficial incluem a facilidade de instalação, inspeção, mudança de posição e limpeza de emissores, além da possibilidade de verificação dos padrões de umidade na superfície do solo e na medida da vazão dos emissores, individualmente.

Um dos principais problemas do sistema é a avaria das mangueiras, tradicionalmente instaladas sobre a superfície do solo, por enxadas, roçadores, insetos, radiação solar e roedores. Principalmente por este motivo, alguns cafeicultores, há alguns anos atrás, optaram por enterrar os tubo gotejadores, para evitar estes problemas, além de aumentar a vida útil das mangueiras, que não sofrem a ação direta da radiação solar.

Alguns projetos, porém, tiveram muitos problemas, não pelo enterro das mangueiras, mas por erros operacionais e/ou de projetos, como: instalação das mangueiras muito profundas e distantes das linhas de café; utilização de gotejadores convencionais; falta de manutenção; sistemas com águas de baixa qualidade física, química e biológica, com projetos sem filtros e pré-filtro adequados.

Mesmo com insucessos, as constantes avarias nas mangueiras instaladas superficialmente fizeram que empresas de irrigação e cafeicultores voltassem a pensar em enterrar os tubos gotejadores.

Apesar de ter sido criticado nos últimos anos por pesquisadores e extensionistas, com o desenvolvimento de novas tecnologias que garantem a uniformidade de aplicação da água próxima a 100%, as críticas ao gotejamento enterrado tem sido minimizadas. Este sistema se caracteriza pelo fato da emissão de água ser feita superficialmente, com a frente de umidade tangenciando a superfície do solo (dependendo da profundidade), evitando a exposição de superfície molhada e reduzindo, ainda mais, as perdas por evaporação.

A distribuição de água no bulbo molhado é dependente do volume total de água aplicado, da vazão, da posição do gotejador (na superfície do solo ou enterrado), da disposição dos gotejadores (fonte pontual ou fonte em linha), das condições iniciais e de contorno, das propriedades físicas do solo e de sua distribuição espacial, da atividade do sistema radicular das plantas e do manejo da irrigação.

Nogueira et al. (2000) desenvolveram trabalho de campo objetivando estabelecer comparações entre os bulbos molhados por gotejadores localizados na superfície do solo, e enterrados no final do ciclo da irrigação, além de avaliar modelos matemáticos para a estimativa das dimensões desses volumes molhados. O estudo foi conduzido em um solo Podzólico Vermelho-Amarelo, em Fortaleza, CE. Em ambos os casos, foi aplicado simultaneamente, o volume de 4,33 x 10-3 m3 (4,33L) de água numa vazão de 7,22 x 10-7 m3 s-1 (2,6 L h-1). O monitoramento da dinâmica da água no solo foi realizado através de tensiômetros. Nas figuras 4 e 5 podem ser visualizados os comportamentos das distribuições de água após a primeira e segunda irrigações, para o gotejamento enterrado e superficial. Ao final de dois ciclos de irrigação observou-se, no volume molhado sob gotejamento enterrado, um teor de água disponível variando entre 44% a 29% maior que no caso do emissor superficial.

Nestes 15 anos, os gotejadores evoluíram bastante, permitindo a sua instalação sob o solo. Assim, para que não ocorram os mesmos problemas verificados no passado, devem-se seguir algumas recomendações:

  • Utilização de gotejadores adequados, dotados de mecanismos ansifão/antidrenantes/autolimpantes.
  • Os gotejadores devem estar espaçados de modo a formar uma faixa úmida.
  • Enterro na profundidade e distância correta das linhas de café. Deve-se enterrar, no máximo, a 15 cm de profundidade, a até 30 cm da linha de café.
  • Respeito às manutenções preventivas e corretivas: dependendo da qualidade da água, deve-se sempre aferir a vazão das linhas laterais, pressões nos cavaletes e finais de linha e aplicação de produtos para evitar obstruções (cloro, ácidos, etc.).
  • Aplicação periódica de herbicidas via água de irrigação, para evitar a intrusão de raízes nos gotejadores. Recomenda-se a aplicação do produto Trifuralina (Treflan, a 43%), 2 vezes ao ano (uma vez antes do estresse hídrico e uma vez após o término das chuvas), na dose de 2 cm3 para cada 8 gotejadores.
  • Avaliações periódicas: pelo menos uma vez por ano, recomenda-se aferir as vazões e pressões, se possível seguindo-se a metodologia internacional (em cada setor, escolhem-se quatro linhas, uma próxima da válvula, duas intermediárias e uma no final da linha de derivação; em cada linha, escolhem-se 4 gotejadores para medir a vazão: um no início da linha, dois intermediários e um no final da linha). Em cada uma destas quatro linhas, mede-se a pressão no início e no final da mesma. Embora mais difícil e trabalhosa que nos gotejadores em superfície, as avaliações nos sistemas enterrados são primordiais, para que a vida útil do sistema seja garantida.

Em Monte Carmelo, Triângulo Mineiro, talvez exista um dos mais antigos projetos de gotejo enterrado para café. O sistema foi instalado com emissores adequados, enterrados na profundidade e distância adequadas, sendo feitas as manutenções periódicas, principalmente nos quatro primeiros anos de funcionamento. O projeto foi instalado em 2005 e a primeira avaliação, em 2009, chegou a um coeficiente de uniformidade de aplicação de água de 94%, o que classifica o projeto como excelente.

Nos quatro anos seguintes, por motivos diversos, não foi feita qualquer manutenção no sistema, nem mesmo na aplicação de Trifluralina. Mesmo tendo sido feitas as fertirrigações sistemáticas na lavoura, a avaliação de 2012 chegou a um coeficiente de uniformidade de 91%, ainda classificando o sistema como excelente.

Trata-se de um exemplo que estimula cafeicultores e projetistas a adotarem o enterro das mangueiras. Pode-se dizer que a tecnologia é viável, desde que se respeitem as recomendações que constam neste artigo. Em 2012/2013, muitos cafeicultores tecnificados adotaram a técnica, com sucesso.